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Charlatanismo

Autor: Marcus Vinicius de Azevedo Braga

Allan Kardec, no capítulo 28 de O Livro dos Médiuns, trata do charlatanismo e do embuste, o que pode parecer a princípio um tema antigo, perdido no auge das manifestações físicas na época da codificação, mas um breve passeio pela internet nos mostra que os assuntos afetos ao intercâmbio mediúnico são sempre envoltos em grande popularidade, mesclando medo e curiosidade, o que motiva situações nitidamente fraudulentas, e que ganham curtidas, compartilhamentos e destaques, inclusive entre os espíritas.

Diversas fotos e vídeos trazem aparições de Espíritos, além de povoarem as redes sociais previsões e comunicações bombásticas sobre temas afetos a política e celebridades, e dado que a mediunidade não é um patrimônio dos espíritas, diversos desses fenômenos podem sim ser fenômenos efetivos, mas também estão passíveis de serem fraudulentos, em um contexto que envolve a natureza destes, mas também as intenções ocultas e, ainda, a consistência do seu teor.

A fraude é uma atuação intencional no sentido de se omitir a realidade com uma versão que atenda aos interesses do fraudador. Qualquer transação humana é passível de fraude, e a relação com os desencarnados não se faz imune desse mal. Inclusive, desde os tempos de Kardec até hoje, ainda somos acusados de fraudadores pelos nossos detratores, como se pode verificar em uma rápida pesquisa na mesma internet. Aliás, contrapor argumentos e provas é muito mais difícil do que desmerecer pela acusação da fraude, mas isso não quer dizer que não exista muita fraude por aí.

Vamos dividir, para fins da presente análise, a fraude em dois aspectos…, um relacionado à veracidade do fenômeno, e outro, complementar, ligado ao teor da comunicação. Todos podem ser objeto de uma ação fraudulenta, e, nesse sentido, pontuamos, nas linhas do codificador, que quanto mais maravilhoso, quanto mais espetacular, maior o risco de fraude, pois existe aí o interesse político, financeiro ou de evidência embutido. Mas o fato é que esse interesse se apresenta por vezes de forma sutil, exigindo sempre cautela.

No que tange à fraude da veracidade, mais ligada a fenômenos físicos, temos que um indivíduo busca por truques, por mecanismos naturais ou outros dispositivos, simular fenômenos e atribuí-los à ação de Espíritos, podendo se tratar aí de materializações, aparições, mas também de comunicações inteligentes, como as vidências, previsões futurísticas e cartas do Além, e que, ao vivo ou por meio de filmagens/fotos, iludem as pessoas da presença de Espíritos, motivando o atendimento de interesses, que não demoram a transparecer. O interesse do indivíduo é mostrar que ele tem poderes sobrenaturais e com isso angariar credibilidade.

O que nos importa na fraude de veracidade é identificar se ali existe um fenômeno mediúnico verdadeiro, e, nesse sentido, a idoneidade do médium é um fator determinante, como assevera Allan Kardec. Necessário, mas insuficiente, posto que é preciso também analisar o que ocorre ali, com um certo olhar científico e investigativo, verificando se não se trata de uma ação deliberada oriunda de uma fraqueza da pessoa, dado que aspectos morais estão sujeitos a chamamentos e tentações. O mundo sempre nos surpreende…

No que tange ao teor, é uma decorrência da fraude de veracidade, presa a aspectos das manifestações inteligentes, e diferente de uma mistificação, na qual o Espírito se utiliza do médium para trazer informações equivocadas, nesse caso, o próprio suposto médium se utiliza de sua simulação para introduzir “verdades” que atendem ao seu interesse. Alimenta seus objetivos por revelações e afirmações, que cedo ou tarde lhe trarão algum ganho, e que proliferam, em especial, próximo a eventos de grande relevância, ou de pleitos eleitorais.

No que tange ao teor, além da análise da idoneidade do médium, a boa fórmula kardequiana do crivo da razão, do uso da lógica e da comparação entre diversas fontes, bem como com os conhecimentos sedimentados pela Doutrina espírita, apresentam-se como boas medidas, associando possíveis interesses aos absurdos divulgados nessas mensagens. Discutir, analisar, ponderar é uma boa prática e que, longe de ser ofensiva, é nosso legado espírita para navegar de forma segura em mares de tantas informações incertas.

Antes de clicar o botão “compartilhar”, antes de propagar aquela foto do sobrenatural, aquela mensagem psicografada, respiremos fundo, lembremos do nosso estudo, e nos atenhamos a olhar com mais carinho o que se apresenta ali. Lembremos que Espírito superior não se detém a questões comezinhas e que a responsabilidade da encarnação é nossa. A teoria da comunicação assevera que o foco é o receptor, e este tem grande responsabilidade na assimilação e na reprodução do que chega a ele, em tempos de vida em rede.

O consolador – Artigos

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