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Os animais médiuns

Autor: Revista Espírita, dissertações espíritas, agosto de 1861  (Sociedade Espírita de París. Sr. d’Ambel.)

Abordo hoje essa questão da mediunidade dos animais, levantada e sustentada por um de vossos mais fervorosos adeptos. Ele pretende, em virtude deste axioma, quem pode o mais pode o menos, que nós podemos medianimizar os pássaros e os outros animais, e deles nos servir em nossas comunicações com a espécie humana. É o que chamais em filosofia, ou antes em lógica, pura e simplesmente um sofisma.

“Vós animais, disse ele, a matéria inerte, quer dizer, uma mesa, uma cadeira, um piano; a foniori devereis animar a matéria já animada e notadamente dos pássaros.” Pois bem! No estado normal do Espiritismo, isso não é assim, isso não pode existir.

De início, convenhamos bem os nossos fatos. Que é um médium?

É o ser, o indivíduo que serve de traço de união aos Espíritos, para que estes possam com facilidade comunicar-se com os homens: Espíritos encarnados. Por conseguinte, sem médium, de nenhum modo comunicações tangíveis, mentais, descritivas, físicas, nem de qualquer espécie que seja.

É um princípio que, disso estou seguro, é admitido por todos os Espíritas: é que os semelhantes agem com os seus semelhantes e como os seus semelhantes. Ora, quais são os semelhantes dos Espíritos, senão os Espíritos, encarnados ou não? É preciso repeti-lo sem cessar? Pois bem! Eu vo-lo repetirei ainda: O vosso perispírito e o nosso são hauridos no mesmo meio, são de uma natureza idêntica, são semelhantes, em uma palavra; possuem uma propriedade de assimilação mais ou menos desenvolvida, de imantação mais ou menos vigorosa, que nos permite, Espíritos e encarnados, nos colocar muito prontamente, e muito facilmente, em relação. Enfim, o que pertence dele próprio aos médiuns, o que é mesmo da essência de sua individualidade, é uma afinidade especial, e ao mesmo tempo uma força de expansão particular, que aniquila neles toda refratariedade, e estabelece, entre eles e nós, uma espécie de corrente, uma espécie de fusão, que facilita as nossas comunicações. De resto, é essa refratariedade da matéria que se opõe ao desenvolvimento da medianimidade na maioria daqueles que não são médiuns. Acrescentarei que é a essa qualidade refratária que é preciso atribuir a particularidade que faz com que certos indivíduos, não médiuns, transmitam e desenvolvam a medianimidade, pelo seu simples contato, em médiuns novatos ou médiuns quase passivos, quer dizer, desprovidos de certas qualidades medianímicas.

Os homens estão sempre dispostos a tudo exagerar; uns, não falo aqui dos materialistas, recusam uma alma aos animais, e outros querem lhes dar uma, por assim dizer, semelhante à nossa. Por que querer assim confundir o perfectível com o imperfectível? Não, não, ficai disto bem convencidos, o fogo que anima os animais, o sopro que os faz agir, mover e falar em sua linguagem, não tem, quanto ao presente, nenhuma aptidão a se misturar, a se unir, a se fundir com o sopro divino, a alma etérea, o Espírito, em uma palavra, que anima o ser essencialmente perfectível, o homem, esse rei da criação. Ora, não é o que faz a superioridade da espécie humana sobre as outras espécies terrestres senão essa condição essencial de perfectibilidade? Pois bem! Reconhecei, pois, que não se pode assimilar ao homem, único perfectível, em si mesmo e em suas obras, nenhum indivíduo de outras raças vivas sobre a Terra.

O cão, que sua inteligência superior entre os animais tornou o amigo e o comensal do homem, é perfectível de sua cabeça e de sua iniciativa pessoal? Ninguém ousaria sustentá-lo: porque o cão não faz o cão progredir; e aquele, entre os melhores adestrados, está sempre adestrado pelo seu mestre. Desde que o mundo é mundo, a lontra edifica sempre sua choupana sobre as águas, segundo as mesmas proporções e seguindo uma regra invariável; os rouxinóis e as andorinhas nunca construíram seus ninhos de modo diferente que os seus pais não o fizeram. O ninho de pardal, antes do dilúvio, como o ninho de pardal da época moderna, é sempre um ninho de pardais, edificado nas mesmas condições e com o mesmo sistema de entrelaçamento de fios de ervas e de detritos recolhidos na primavera, na época dos amores. As abelhas e as formigas, essas pequenas repúblicas econômicas, jamais variaram em seus hábitos de aprovisionamento, em seu modo de proceder, em seus costumes, em suas produções. Enfim, a aranha tece sempre a sua teia do mesmo modo. Por outro lado, se procurardes as cabanas de folhagem e as tendas das primeiras idades da Terra, encontrareis em seu lugar os palácios e os castelos da civilização moderna; às vestes de peles brutas, sucederam os tecidos de ouro e de seda; enfim, a cada passo, encontrais a prova dessa marcha incessante da Humanidade para o progresso.

Desse progresso constante, invencível, irrecusável da espécie humana, esse estacionamento indefinido das outras espécies animadas, concluí comigo que, se existem princípios comuns ao que vive e se move sobre a Terra: o sopro e a matéria, não é menos verdadeiro que só vós, Espíritos encarnados, estais submetidos a essa inevitável lei do progresso, que vos impele fatalmente para a frente, e sempre para a frente. Deus colocou os animais ao vosso lado como auxiliares para vos nutrir, vos vestir, vos secundar. Deu-lhes uma certa dose de inteligência, porque, para vos ajudar, lhes seria necessário compreender, e proporcionou a sua inteligência aos serviços que são chamados a fazer; mas, em sua sabedoria, não quis que fossem submetidos à mesma lei do progresso; tais foram criados, tais permanecem e permanecerão até a extinção de suas raças.

Foi dito: os Espíritos medianimizam e fazem mover a matéria inerte, as cadeiras, as mesas, os pianos; fazem mover, sim; mas medianimizam, não! Por que, ainda uma vez, sem médium, nenhum desses fenômenos podem se produzir. Que há de extraordinário que, com a ajuda de um ou de vários médiuns, façamos mover a matéria inerte, passiva, que, justamente em razão de sua passividade, de sua inércia, é própria para sofrer os movimentos e os impulsos que desejamos imprimir-lhes? Para isso temos necessidade de médiuns, é positivo; mas não é necessário que um médium esteja presente ou consciente, porque podemos agir com os elementos que nos fornece, com o seu desconhecimento e fora de sua presença, sobretudo, nos fatos de tangibilidade e de transporte. Nosso envoltório fluídico, mais imponderável e mais sutil do que o mais sutil e o mais imponderável de vossos gases, unindo-se, casando-se, combinando-se com envoltório fluídico mais animalizado do médium, e cuja propriedade de expansão e de penetrabilidade é inapreciável para os vossos sentidos grosseiros, e quase inexplicável para vós, nos permite mover móveis e mesmo quebrá-los em peças inabitadas.

Certamente, os Espíritos podem tornar-se visíveis e tangíveis para os animais, e, frequentemente, tal temor súbito que os toma, e que não vos parece motivado, é causado pela visão de um ou de vários desses Espíritos mal intencionados para os indivíduos presentes, ou para aqueles a quem pertencem esses animais. Muito frequentemente, apercebeis-vos de cavalos que não querem nem avançar e nem recuar, ou que se empinam diante de um obstáculo imaginário. Pois bem! Tende por certo que o obstáculo imaginário, frequentemente, é um Espírito ou um grupo de Espíritos, que se divertem impedindo-os de avançar. Lembrai-vos do asno de Balaão, que vendo um anjo diante dele, e temendo sua espada flamejante, obstinava-se em não se mexer; é que antes de se manifestar visivelmente a Balaão, o anjo quis se tornar visível só para o animal; mas, repito-o, nós não medianimizamos diretamente nem os animais, nem a matéria inerte; sempre nos é preciso o concurso, consciente ou inconsciente, de um médium humano, porque nos é necessária a união de fluidos similares, o que não encontramos nem nos animais, nem na matéria bruta.

O Sr. Thiry, disse, magnetizou seu cão; a que chegou? Matou-o; porque esse infeliz animal morreu depois de ter caído numa espécie de atonia, de languidez, consequência de sua magnetização. Com efeito, inundando-o de um fluido haurido numa essência superior à essência especial de sua natureza, esmagou-o e agiu sobre ele, embora mais lentamente, à maneira do raio. Portanto, como não há nenhuma assimilação possível entre o nosso perispírito e o envoltório fluídico dos animais, propriamente ditos, nós os esmagaremos, instantaneamente, magnetizando-os.

Isso estabelecido, reconheço perfeitamente que, entre os animais, existem aptidões diversas; que certos sentimentos, que certas paixões idênticas às paixões e aos sentimentos humanos se desenvolvem neles; que são sensíveis e reconheci-dos, vingativos e odiosos, segundo se proceda bem ou mal com eles. É que Deus, que não faz nada incompleto, deu aos animais, companheiros ou servidores do homem, qualidades de sociabilidade que faltam inteiramente aos animais selvagens, que habitam as solidões.

Para resumir: os fatos medianímicos não podem se manifestar sem o concurso consciente ou inconsciente do médium; e não é senão entre os encarnados, Espíritos como nós, que podemos encontrar aqueles que podem nos servir de médiuns. Quanto a adestrar os cães, os pássaros ou outros animais, para fazer tais ou tais exercícios, é vosso assunto e não o nosso.

ERASTO.

Nota. A propósito da discussão que ocorreu na Sociedade sobre a mediunidade dos animais, o Sr. Allan Kardec disse que observou muito atentamente as experiências que se fizeram, nestes últimos tempos, sobre pássaros aos quais se atribuía a faculdade medianímica, e acrescentou que reconheceu, da maneira mais incontestável, os procedimentos da prestidigitação, quer dizer, que cartas forçadas, mas empregadas com bastante destreza para iludir os expectadores que se contentam com a aparência sem examinar o fundo. Com efeito, esses pássaros fazem coisas que nem mesmo o homem mais inteligente, nem mesmo o sonâmbulo mais lúcido, poderiam fazer, de onde seria preciso concluir que possuem faculdades intelectuais superiores ao homem, o que seria contrário às leis da Natureza. O que é preciso mais admirar nessas experiências, é a arte, a paciência que foi preciso empregar para adestrar esses animais, torná-los dóceis e atentos; para obter esses resultados, certamente, foi preciso ter relações com naturezas flexíveis, mas isso não pode ser, em definitivo, senão animais adestrados, nos quais há mais hábito do que combinações; e a prova disso é que, se a deixam de exercer durante algum tempo, perdem logo o que aprenderam. O encanto dessas experiências, como o de todos os torneios de prestidigitação, está no segredo dos procedimentos; uma vez conhecido o procedimento, perdem todo o seu atrativo; foi o que ocorreu quando os saltimbancos quiseram imitar a lucidez sonambúlica pelo pretenso fenômeno do que chamavam a dupla vista. Não podia ali haver ilusão para quem conhecesse as condições normais do sonambulismo; ocorre o mesmo com a pretensa mediunização dos pássaros da qual todo observador experimentado pode, facilmente, se dar conta.

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