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Os espíritos barulhentos: Meios para se livrar deles

Revista Espírita, fevereiro de 1859

Escrevem-nos de Gramat (Lot):

“Em uma casa do lugarejo de Coujet, comuna de Bastat (Lot), ruídos extraordinários se fazem ouvir desde uns dois meses. Eram primeiro golpes secos, e muito semelhantes ao choque de uma clava sobre as tábuas, que se ouviam de todos os lados: sob os pés, sobre a cabeça, nas portas, através dos móveis; depois logo os passos de um homem que caminhava de pés nus, o tamborilar de dedos sobre as vidraças. Os habitantes da casa se amedrontaram e mandaram dizer missas; a população inquieta dirigiu-se para o lugarejo e ouviu; a polícia interveio, fez várias investigações, e o ruído aumentou. Logo, foram portas abertas, objetos transtornados, cadeiras projetadas pela escada, móveis transportados do térreo para o sótão. Tudo o que vos conto, atestado por um grande número de pessoas, passa-se em pleno dia. A casa não é um antigo casebre sombrio e negro, do qual só o aspecto faz cogitar fantasmas; é uma casa recentemente construída, que é agradável; os proprietários são pessoas boas, incapazes de quererem enganar alguém, e doentes de medo. Entretanto, muitas pessoas não pensam que nada há de sobrenatural, e tratam de explicar, seja pela física, seja por más intenções que emprestam aos habitantes da casa, tudo que ali se passa de extraordinário. Por mim, que vi e creio, resolvi dirigir-me a vós para saber quais são os Espíritos que fazem esse barulho, e conhecer o meio, se houver um, de fazê-los calarem-se. É um serviço que prestais a essas boas pessoas, etc….” Os fatos dessa natureza não são raros; eles se assemelham quase todos e não diferem, em geral, senão pela sua intensidade e sua maior ou menor tenacidade. Pouco se inquieta com eles quando se limitam a alguns ruídos sem consequência, mas se tomam uma verdadeira calamidade quando adquirem certas proporções. Nosso honorável correspondente nos pergunta quais são os Espíritos que fazem esse barulho. A resposta não é incerta: sabe-se que Espíritos de uma ordem muito inferior são os únicos deles capazes.

Os Espíritos superiores, tanto quanto entre os homens graves e sérios, não se divertem fazendo algazarra. Frequentemente, os chamamos para perguntarmos o motivo que os levam a perturbarem assim o repouso. A maioria não tem outro objetivo senão o de se divertir; esses são Espíritos antes levianos que maus, que se riem do pavor que ocasionam, e das buscas inúteis que se fazem para descobrir a causa do tumulto.

Frequentemente, se aferram junto a um indivíduo, que se alegram em vexar, e que perseguem de morada em morada; outras vezes se ligam a um local sem outro motivo que seu capricho. Algumas vezes, é uma vingança que exercem, como teremos ocasião de ver. Em certos casos, sua intenção é mais louvável; querem chamar a atenção e se porem em comunicação, seja para darem uma advertência útil à pessoa à qual se dirigem, seja para pedirem alguma coisa para eles mesmos. Vimo-los, frequentemente, pedirem preces, outras vezes solicitarem o cumprimento, em seu nome, de um voto que não puderam cumprir, outras vezes, enfim, querer, no interesse de seu próprio repouso, repararem uma ação má cometida por eles quando viviam. Em geral, comete-se o erro de com eles se amedrontar; sua presença pode ser importuna, mas não perigosa. Concebe-se, de resto, o desejo que se tem de livrar-se deles e se faz, geralmente, para isso, tudo ao contrário do que seria preciso. Se são Espíritos que se divertem, quanto mais se toma a coisa a sério, mais persistem, como crianças traquinas que aborrecem mais aqueles que veem se impacientarem, e que metem medo aos covardes. Se se tomasse o sábio partido de rir por si mesmo, de seus maus rodeios, acabariam por se cansarem e por ficarem tranquilos. Conhecemos alguém que, longe de se irritar, os excitava, desafiava-os para fazerem tal ou tal coisa, tão bem que, ao cabo de alguns dias, não retomavam mais. Mas, como dissemos, existem alguns cujo motivo é o mais frívolo. Por isso, é sempre útil saber o que querem. Se pedem alguma coisa, pode-se estar certo que cessarão suas visitas, desde que seu desejo seja satisfeito. O melhor meio de estar informado a esse respeito é o de evocar o Espírito, por intermédio de um bom médium escrevente; pelas suas respostas, ver-se-á o que disputam, e se agirá em consequência; se for um Espírito infeliz, a caridade manda tratá-lo com as considerações que merece. Se for um mau brincalhão, pode-se agir para com ele sem cerimônia; se for malevolente, é preciso pedir a Deus para torná-lo melhor. Em todo estado de defesa, a prece não pode sempre ter senão um bom resultado. Mas a gravidade das fórmulas de exorcismo fá-los rirem e não as têm em nenhuma conta Podendo-se entrar em comunicação com eles, é preciso desconfiar das qualificações burlescas ou apavorantes que se dão, algumas vezes, para se divertirem com a credulidade.

A dificuldade, em muitos casos, é ter um médium à disposição. É preciso, então, procurar tornar-se a si mesmo, ou interrogar diretamente o Espírito, conformando-se com os preceitos que demos, a esse respeito, em nossa Instrução prática sobre as manifestações.
Esses fenômenos, embora executados por Espíritos inferiores, frequentemente, são provocados por Espíritos de uma ordem mais elevada, com a finalidade de convencer quanto à existência de seres incorpóreos e de um poder superior ao homem. A ressonância que deles resulta, o medo mesmo que eles causam, chamam a atenção, e acabarão por abrir os olhos dos mais incrédulos. Estes acham mais simples colocar esses fenômenos à conta da imaginação, explicação muito cômoda e que dispensa dar-lhes outras; todavia, quando objetos são postos em desordem ou vos são lançados à cabeça, seria preciso uma imaginação bem complacente para se figurar que semelhantes coisas são quando não o são. Nota-se um efeito qualquer, esse efeito tem necessariamente uma causa; se uma fria e calma observação nos demonstra que esse efeito é independente de toda vontade humana e de toda causa material, se, além disso, nos dá sinais evidentes de inteligência e de livre vontade, o que é o sinal mais característico, somos forçados a atribuí-lo a uma inteligência oculta. Quais são esses seres misteriosos? É o que os estudos espíritas nos ensinam, do modo o menos contestável, pelos meios que nos dá para se comunicar com eles. Esses fenômenos nos ensinam, além do mais, a separar o que há de real, de falso ou exagerado nos fenômenos dos quais não nos damos conta. Se um efeito insólito se produziu: ruído, movimento, mesmo aparição, o primeiro pensamento que se deve ter é que foi devido a uma causa toda natural, porque é a mais provável; é preciso, então, procurar essa causa com o maior cuidado, e não admitir a intervenção dos Espíritos senão conscientemente; é o meio de não se iludir.

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