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Um grito de alerta ao Movimento Espírita

Autor: Rodrigo Sales (Recife-PE)

Djalma Montenegro de Farias, o grande militante da causa espírita em terras pernambucanas, escreveu em Setembro de 1947 um valioso texto sobre Organização e orientação do movimento espírita onde ele diz: “ Em nossos tempos de confusão e de reajustamento de valores, torna-se necessário que os espíritas militantes, pela responsabilidade que têm, promovam a organização da propaganda (divulgação do Espiritismo) em bases amplas, firmes e cristãs, não tentando pôr em execução qualquer iniciativa que possa entrar em choque com a pureza do Espiritismo, atentando bem para sua finalidade, os seus supremos objetivos, magnificamente explanados nas obras fundamentais da vitoriosa filosofia.”1

Ao analisar tal trecho, um detalhe chama atenção: “não tentando pôr em execução qualquer iniciativa que possa entrar em choque com a pureza do Espiritismo”. Numa imensidão de possíveis iniciativas nocivas ao Espiritismo podemos considerar uma que ganha dia após dia estrondosa força e põe em risco a vitalidade de um movimento que tem como grande proposta promover a espiritualização da sociedade: a diminuição acentuada de jovens e grupos de juventude espírita engajados no movimento dos grandes debates e reflexões entre as ideias espíritas e os problemas humanos que abatem a sociedade.

Indagamos, ou melhor, gritamos: cadê a juventude espírita? E o eco de nossas vozes reverbera pelas paredes vazias das casas espíritas, se perde no ar e ninguém consegue responder. Cadê os nossos jovens que unem a energia pulsante da vida e a efervescência da mocidade com o sentimento de amorosidade capaz de alimentar o sonho de um mundo mais justo, fraterno e pacífico, e não só sonhar como também lutar para que esse Reino de Deus não seja apenas uma representação alegórica das letras contidas nos livros, mas antes a mais genuína vivência social capaz de promover uma revolução cultural na humanidade. Cadê os jovens que amam o Espiritismo não como letra de repetição ou como vivência de aparências, mas sim como doutrina que traz acolhimento, consolo, esclarecimento e orientação não apenas para si, mas também através de si para o próximo seja ele quem for e de onde for. São muitos “cadês” que poderíamos gritar.

Se conformar com algumas unidades de juventude que felizmente existem, resistem e continuam atuantes graças ao trabalho quase que hercúleo dos seus educadores, ao invés de buscar investir na criação e manutenção de novos agrupamentos juvenis devidamente engajados, amados, empoderados e dedicados seria relegar o movimento espírita pernambucano a uma desconexão, e mais ainda, a um descompromisso com as novas gerações que chegam à Terra para cumprir relevantes funções na tão esperada regeneração social pelas veias iluminadas do pensamento espírita tão bem anunciada por Allan Kardec na Revista Espírita de Dezembro de 1863 quando ele diz: “A geração que surge, imbuída das ideias novas, estará em toda a sua força e preparará o caminho da que há de inaugurar o triunfo definitivo da união, da paz e da fraternidade entre os homens, confundidos numa mesma crença, pela prática da lei evangélica.”² Essas ideias novas são as espíritas e esta visão quase que profética de Kardec só se consumará quando o movimento espírita investir tempo, energia, força e amor para fechar este colossal abismo de ausência juvenil aberto debaixo dos nossos próprios pés.

Há receitas prontas para se formar uma juventude espírita? Não. Mas enquanto permanecermos de braços cruzados e não ocuparmos a mente e o coração formulando soluções para este que é um dos graves problemas da atualidade do movimento espírita, não conseguiremos grandes avanços no ideal de propagar pelas palavras e atitudes os ensinamentos transformadores da Doutrina Espírita.

Considerando que o Espiritismo se funda através da prática do diálogo, sugerimos que os espíritas pernambucanos através das instituições a que pertençam ou de forma livre e independente utilizem a criatividade, os recursos tecnológicos atuais e principalmente o amor para construir pontes com os assuntos e demandas da sociedade, onde certamente estão os jovens que compõem esta geração responsável por fazer as grandes reformas sociais. Os jovens, ao perceberem que existem espíritas e casas espíritas abertos para dialogar sobre a vida, para dar oportunidades de falar sobre ideias, para engajar forças juvenis nas atividades que promovem os aprendizados espirituais, certamente serão atraídos para junto dessas pessoas e casas e permanecerão, bem como atrairão outros tantos jovens que ao perceberem a forma acolhedora e amistosa com que são recebidos ficarão também, e assim, as casas espíritas gozarão da oportunidade de terem as suas atividades continuadas e renovadas com a presença da juventude dos tempos atuais, e assim, o movimento espírita terá novos ares de esperança, de integração de forças, de dinamização de ideias colocadas a serviço da sociedade para mudar definitivamente a percepção obtusa dos que enxergam a matéria como a causa de tudo na vida.

Por fim, certamente não questionaremos mais cadê a juventude espírita, e sim diremos: felizes somos porque temos uma grande e próspera juventude espírita.

¹ Farias, Djalma Montenegro. Coleção Obras Completas de Djalma Farias, volume 1 – Recife, editoração gráfica Luizângelo Barreto, 2000.
² Kardec, Allan. Revista Espírita – Dezembro, 1863: Período de Luta, tradução de Evandro Noleto Bezerra, FEB, 2004.

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