O consolo pela casa espírita

Autor: Rogério Miguez

Há dois milênios, uma singular personagem de nossa história – Jesus, o Cristo de Deus -, deixou-nos uma imortal mensagem eminentemente consoladora, baseada no que aprendeu do Pai nosso ao longo de sua jornada evolutiva, prometendo, ao final de sua breve missão, o envio de outro Consolador para permanecer conosco até o final dos tempos. Ele tinha plena consciência de que a humanidade ainda teria alguma dificuldade em bem aproveitar aqueles ensinos que trazia sobre as imutáveis leis divinas, mesmo considerando que suas palavras estavam muito bem lastreadas pelos múltiplos exemplos exercitados no cotidiano de sua curta existência na Terra.

É de se observar que, naquela época, ainda não seria possível apresentar na totalidade alguns ensinos baseados nos princípios divinos. Sendo assim, fazia-se necessário o advento de outro conjunto de ideias, fortalecendo e relembrando o que havia sido dito no passado, e, ao mesmo tempo, preenchendo as lacunas de conhecimento deixadas nos ensinos Crísticos, de forma deliberada. Esta outra proposta consoladora daria continuidade à tarefa iniciada com o advento da Boa Nova.

Os séculos escoaram e durante este longo período vários Espíritos de reconhecido saber aportaram na Terra, ajudando a humanidade a melhor perceber quais são os objetivos da vida. Por fim, brilhantes luzes fizeram-se uma vez mais presentes em nossa caminhada, quando o século XIX raiou com renovadas esperanças para todos os desalentados habitantes do Orbe, desorientados e desesperançados pelo predomínio das ideias materialistas naquela época. A Terra iluminou-se mais uma vez por meio de uma nova Doutrina intitulada Espiritismo, o tão aguardado Consolador Prometido outrora anunciado pelo Mestre dos mestres.

Por coincidência, na urbe conhecida por Cidade Luz – Paris – renascia a renovadora e eterna mensagem do Criador agora em sua plenitude, estruturada por um filho das terras francesas, educado com esmero na Suíça, plenamente acostumado com os raciocínios lógicos e disciplina mental. Um homem de métodos apurados, de aguda percepção da realidade, virtuoso, em suma um sábio: Allan Kardec.

A novel Doutrina dos Imortais começou a deitar raízes em solo francês para, em seguida, alcançar outras regiões europeias. Mais tarde, singrando com rapidez os oceanos para além do velho continente, aportou em solo americano e, entre outras, o Espiritismo se fez presente nas terras brasileiras.

À exemplo do Codificador e educador Allan Kardec, o movimento espírita brasileiro iniciou e incentivou a estruturação de locais apropriados à difusão dos seus princípios, pequeninas células que, desejosas em também cumprir a promessa do Cristo, começaram a espalhar consolação aos quatro ventos. Afinal, esta é a fundamental proposta espírita: materializar o desejo de Jesus através da disseminação de seus ensinos, consolando, em consequência.

E assim acontece desde a chegada dos primeiros livros da codificação; com o consequente entendimento dos postulados doutrinários, seguidores da Doutrina vêm esforçando-se em levar consolação a quem quer que os procure. Esta tem sido uma marcante tônica do movimento.

Entretanto, é preciso observar que esta consolação não se faz apenas e exclusivamente quando se enxugam os olhos cansados e tristes de tanto chorar dos muitos aflitos desta nossa Pátria tão sofrida – E quem não o é? -, secando incontáveis lágrimas, oferecendo um ombro amigo, uma palavra de alento e esperança direcionada, de modo direto, à particular agonia do próximo. O conforto pode ser efetuado também sem que o trabalhador espírita se dirija de modo exclusivo ao angustiado, interagindo com ele pessoalmente.

É comum que se procure um centro espírita quando o indivíduo se encontra perdido, desorientado, em dores atrozes, desalentado com tantas preocupações do dia a dia, em uma tentativa de escutar uma palavra amiga dita em conversação particular. Contudo, outros, embora não totalmente tranquilos, às casas espíritas dirigem-se para aprender apenas por meio das  exposições e palestras abordando as muitas temáticas espíritas. Os últimos, às vezes, até desconhecem as específicas atividades consoladores desempenhadas por atendentes fraternos.

Entretanto, quando escutam e entendem os elucidativos princípios espíritas, que nada mais objetivam do que explanar sobre as eternas leis de Deus, destacando em especial os muitos exemplos de vida do Governador da Terra – Jesus -, encontram a paz de espírito tão procurada nestes tempos turbulentos, têm acalmadas suas mentes através das explicações das dúvidas que possam carregar, alcançam alívio para seus corações oprimidos, sem que ninguém precise enxugar as suas possíveis lágrimas que vertem, às vezes, em segredo, quando estão a sós.

Desta forma, percebem-se dois possíveis caminhos para levar a consolação aos aflitos: o contato amigo mais direto dos chamados atendentes fraternos, conversando com paciência e amor com todos os que os procuram na casa espírita; bem como através das boas preleções, abordando com propriedade as leis de Deus, que, ao esclarecer o ouvinte, certamente o consola sem que fosse este o específico móvel da exposição. Desconhecendo, muitas vezes, o expositor consola o participante da reunião ao explicar por qual ou quais razões o indivíduo encontra-se naquela particular situação de aparente infortúnio.

Tanto isto é verdade que perguntaram a um antigo e experiente atendente fraterno quais eram as mais contundentes aflições levadas a este trabalhador em sua atividade de esclarecimentos. Ele respondeu de pronto que, de fato, não eram os variados infortúnios ou tormentos em si que preocupavam os aflitos, mas, sim, a causa da desdita, por qual razão o atendido estava passando por aquela tribulação. Esta sim, era a principal preocupação, o cerne da questão.

Ora, se isto é fato, qualquer boa explanação espírita pode consolar, desde que esclareça na totalidade, ou pelo menos aponte o possível motivo gerador da insatisfação pessoal, enfatizando que não há dificuldade surgida na vida do Espírito que seja injusta e eterna.

Esta visão mais ampla do que seja consolação, ou por outra, como esta acontece em suas diversas matizes, é pouco conhecida e entendida. Muitos acreditam que só há consolação se ocorrer uma conversa pessoal com o consulente, “olhos nos olhos”, em local privado e especialmente preparado para tanto.

Todavia, mesmo neste ambiente consagrado, com um atendente dedicado com exclusividade, caso este não explique ou aborde os princípios espíritas, tais como: a imortalidade do Espírito, a certeza da vida futura, a inexistência de injustiças no ordenamento divino, a realidade da lei das muitas vidas, jamais consolará, embora ambos acreditem o contrário. Na primeira recaída do consulente, ou mesmo no surgimento de outra aparente desventura, ele retornará célere para novo atendimento e assim fará até o final da existência.

Um dos grandes estudiosos do Espiritismo, J. Herculano Pires, assim expressou-se sobre o tema[1]:“O consolo que o Espiritismo nos dá não é a proteção fictícia da fé cega, dos sacramentos vazios de sentido, do socorro espiritual egoísta, em forma de privilégio injustificável, do paternalismo dos sacerdotes profissionais, dos agrados interesseiros de médiuns venais. O Consolador não se manifesta através de prodígios sobrenaturais, mas na forma de esclarecimentos positivos, de revelação científica das leis naturais que até agora olvidamos ou encaramos como crianças choramingas pedindo colo.”

Depreende-se do texto que há plena consolação quando se obtém conhecimento que conduza ao entendimento dos sofrimentos e agruras, os porquês, principalmente em relação a fatos de cunho incompreensível ou inexplicável.

Desta forma, a pacificação interior e a possível resignação, são o resultado do que se ouve nas preleções; bem como nos conselhos e orientações tão bem estruturadas pela lógica e pelo amor oferecidos por trabalhadores dedicados, ambos propondo ao frequentador uma transformação íntima e consequente prática de vida, visando sempre o bem.

Referência

1 PIRES, J. Herculano. O Centro Espírita. cap. VI — As almas frágeis.

DICA

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