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Honorato Balzac

Em todas as obras escritas pelos grandes pesquisadores e estudiosos dos problemas espíritas, em face da reencarnação, encontra-se uma afirmativa de caráter geral, uniforme: – “O gênio constitui a súmula dos mais longos esforços em múltiplas existências de abnegação e de trabalho, na conquista dos valores espirituais. Cada um colhe o fruto imperecível das suas obras passadas e presentes; colhe-o, não por efeito de uma causa externa, mas por um encadeamento que liga em nós mesmos o prazer à alegria, o esforço ao êxito, a culpa ao castigo. 

As missões do ser, seu destino, sua ação na evolução geral, ir-se-ão definindo cada vez mais no sentido de suas próprias aptidões, a princípio latentes e confusas no começo de sua carreira, mas que vão despertar, crescer, acentuar-se à medida que ele for percorrendo a imensa espiral. “

Muitos dos escritores famosos, em seus primeiros anos de ensaio literário, só obtiveram fracassos, não lhes faltando conselhos no sentido de jamais pensarem em literatura.

Precisamos convir que muitos desses Espíritos portadores de grande e respeitável bagagem literária, que têm retornado e continuarão retornando ao ambiente terreno, em novos corpos de carne, seja por esta ou por aquela falta cometida em vidas outras, ou por livre vontade, estão sujeitos, de início, nessa nova encarnação, a uma série de fracassos e de dificuldades de todo o gênero, a fim de provarem. a força de seu ideal, a tenacidade de seus propósitos na execução dos trabalhos para os quais se prepararam.  

Honorato Balzac, nome conhecidíssimo nos meios literários, foi um escritor nato, uma dessas criaturas em cujo seio vivem germens de mediunidade inconsciente, em que suas faculdades rememorativas de vidas outras se manifestam, ora um tanto baralhadas, confusas, carecendo, por isso, de mais perfeito desenvolvimento orgânico, para que desse modo os filtros materiais possam melhor selecionar essas aquisições e consequentemente fixá-Ias em livros. E, até que atingisse essa possibilidade, era natural que Balzac ficasse sujeito a toda sorte de decepções e de desencorajamentos. Nele, no entanto, havia uma convicção inabalável de que seria poeta e escritor respeitado. Realmente, Balzac, além de ter sido, na França no século XIX, um dos maiores romancistas e o mais profundo dos pensadores, foi ocultista de renome.

Teve a ventura de presenciar os primeiros passos do movimento espírita kardequiano, movimento esse que não podia surpreende-lo, de vez que era discípulo de Swendenborg.

Seu pai teimava em fazê-lo advogado, a despeito de sua acentuada propensão para a literatura e filosofia.

Em 1819 bacharelou-se em Direito, quando então pensava haver conseguido a tão ansiada liberdade, para se entregar às lides literárias. Nesta altura, seus pais sofreram grande desequilíbrio financeiro; em tão difícil conjuntura, alguém propôs a seu genitor a cessão a Honorato do ofício de notário. Assentadas as condições dessa transação, o velho Balzac deu-lhe conhecimento dessa resolução. Honorato deixou a todos estupefatos, declarando que jamais seria notário, que seus estudos o esclareceram acerca do seu destino: – literato e poeta!

A verdade é que, se conseguiu vencer a guerra que lhe moveram os pais, outra bem maior teve de sustentar com os homens de letras, editores e jornalistas. A cada passo escutava, após a conclusão de suas produções, o costumeiro “veredictum” dos entendidos: – “Que o autor faça o que bem lhe aprouver, exceto literatura.” A própria Academia Francesa, quando a ela se candidatou, “bateu com a porta na cara do palhaço”.

Balzac escrevia durante 14, 16 e mais horas diárias, enchendo febrilmente laudas e laudas de papel, a fim de não interromper a inspiração que lhe brotava profusamente. 

Enquanto escrevia, num desconfortável quarto de água-furtada, limitava-se a ingerir, de quando em quando, grandes goles de café. Aos amigos e parentes que lhe faziam ver a necessidade de abandonar essa vida intranquila de escritor: dizia sempre, cheio de confiança: – Há vocações às quais é preciso obedecer, e alguma coisa de irresistível me arrasta para a glória e o poder.

Ele deixava-se arrastar, embora esse arrastamento lhe exigisse muito esforço e sacrifício. É que os Espíritos, que o amparavam, transmitiam-lhe, por meio de suas faculdades mediúnicas, vibrações de fé e de confiança no futuro, faziam reavivar em seu espírito, sofrendo agora as restrições que a matéria lhe impunha, a lembrança de que ele possuía cabedais suficientes para conquistar a glória, desde que soubesse obedecer à ordem, que era trabalhar, surdo às críticas demolidoras. Obediente, pois, entregou-se corajosa e heroicamente, durante vinte anos, ao trabalho árduo, penoso, em meio das mais duras privações!

Conta-se que certa vez Balzac se encontrava completamente mergulhado em uma espécie de êxtase, isto é, transe, escrevendo dia e noite a obra que intitulou “Eugênia Grandet”, quando um amigo penetrou em sua água-furtada. Balzac, encaminhando-se para ele, disse, cheio de aflição: – “Imagina, a desgraçada suicidou-se!”

Somente porque o amigo recuou, espantado, em face dessa sua declaração, foi que Balzac percebeu que a heroína do romance, “Eugênia Grandet”, nunca existira, era pura ficção. Por aí se vê que Balzac, como médium, escrevia esse romance, como escrevera muitos outros, sob a influência direta de seus amigos espirituais. E essa influência era de tal ordem que seguidamente ele se esquecia de que estava escrevendo, para só se ater ao desenrolar dos episódios que se sucediam em seu cérebro, como se estivesse assistindo a cenas reais.

Em seus 137 livros, a que denominou “A Comédia Humana”, vários deles encerram passagens alusivas ao Ocultismo e ao Espiritismo. Destacaremos, por exemplo : “Louis Lambert”, “Seraphitus Seraphita”, “Úrsula Mirouet”, “Os Proscritos”, “Ã Procura do Absoluto”, “Peau de Chagrin”, etc. Assim é que vemos úrsula Mirouet contando minuciosamente, ao abade Chaperon, as três aparições sucessivas de seu padrinho, por meio das quais veio a saber que fora Minoret-Levrault a autora do roubo- de que ela, úrsula, fora vítima. 

“Certa tarde – escreveu Balzac – úrsula fêz ao cura a seguinte pergunta: “- Acredita o senhor que os mortos possam aparecer?

“E a resposta do sacerdote foi esta: “- Minha filha, a história sagrada, a história profana e a história moderna oferecem vários testemunhos a esse respeito; mas a Igreja jamais fez disso um artigo de fé, e a Ciência, na França, tem zombado de tais aparições. “

Segue-se então um longo diálogo sobre temas espíritas entre Úrsula e o padre. Em outro trecho dessa obra, o padre Chaperon, para demonstrar como era uma verdade a aparição de Espíritos desencarnados, deu a Úrsula, para ler, a “História de Montmorency”, escrita por um eclesiástico contemporâneo e que conhecera esse príncipe. Nessa história estavam descritas as aparições, a Montmorency, do Espírito de um seu amigo, logo após ter sido morto em campo de batalha.

Na época em que o mesmerismo avassalava a sociedade em geral, e quando também se interrogavam com assiduidade as mesas girantes, Balzac não ficou indiferente a essas coisas estranhas, tanto assim que participou de muitas experiências.

A crença nas ciências ocultas, escreveu Balzac, está muito mais difundida do que imaginam os sábios, advogados, notários, médicos, magistrados e filósofos. Vários homens de Estado, afirmou ele, consultam cartomantes…

Balzac, por meio de sua vidência, lia o futuro. Estudava com interesse as chamadas “forças desconhecidas” que mais tarde mereceram a atenção da Ciência, embora não levasse ela em conta a sua origem.

Todos os que têm lido as obras de Balzac, mormente os que ficaram impressionados com “Louis Lambert” e “fleraphita”, sabem quanto seu autor acreditava na misteriosa ação do pensamento. A esse propósito o Dr. Cabanes disse que, sob o ponto de vista científico, a sugestão e o magnetismo encontraram em Balzac um de seus primeiros adeptos. Ele fazia a si mesmo esta pergunta: – Como se poderia explicar a transmissão do pensamento de um cérebro a outro cérebro, sem gestos, nem palavras, desde que não se admitisse ser o pensamento um fluido transmissível pela vontade? Não foi de Rochas quem reconheceu, pergunta ainda o Dr. Cabanes, as teorias da exteriorização do pensamento, que, em verdade, desenvolveu, com mais amplitude e nitidez, essas ideias de Balzac?

A verdade é que Balzac não perdia tempo em considerações teóricas, a ele só interessava saber quais os resultados práticos que essa força vital seria capaz de proporcionar, força de que ele, por genial intuição, ou, quem sabe, por inspiração superior, conseguiu avaliar o poder.

Isso, porventura, não é manifestação positiva de seus dons mediúnicos?

Balzac não foi, evidentemente, homem de ciência;  todavia, na “Comédia Humana” ele tratou, como verdadeiro vidente, de assuntos científicos então desconhecidos.

Foi, portanto, pela sua mediunidade, um verdadeiro precursor de grandes verdades científicas que só mais tarde mereceram catalogadas pelos homens que o mundo mui justamente classificou de sábios.

Saint-Beuve projetou, realmente, criar uma botânica ou zoologia dos Espíritos, e nós vamos verificar, por meio das obras de Balzac, que ele teve a intuição dessa classificação. No livro “Melmoth reconciliado”, descreve ele os fenômenos de asfixia pelo óxido de carbono. Na obra intitulada “Ã Procura do Absoluto”, previu o papel que o fósforo desempenha na fisiologia nervosa. Em 1835, Balzac criou a personagem – Sr. de Mortsauf, que figura como herói em “Lys dans Ia Vallée”, e que é bem o tipo de nevropata, na mais rigorosa acepção do termo, e no entanto só muito tempo depois, como acentuou o Dr. Nass, foi que os neurologistas fixaram, deI maneira definitiva, a noologia da histeria, da neurastenia, da degenerescência mental, fenômenos fartamente descritos por Balzac.

Brunetiàre diz mesmo que ele anteviu o futuro das ciências naturais, das ciências biológicas, e a revolução que elas fariam até conseguirem entrar no domínio do pensamento. Há mais ainda: a química unitária (atribuída a Gerhardt) e a lei da equivalência das forças físicas, aliás de concepção moderníssima, podem ser encontradas em os livros “À Procura do Absoluto”, “Louis Lambert” e em “Seraphita”. Poder-se-ia mesmo descobrir, pelo menos em gérmen, uma das principais teorias do transformismo, isto é, da adaptação do organismo aos diferentes meios, bastando para isso consultar-se a Introdução da pequena edição das Obras Completas de Balzac, datada de Julho de 1842. Causa por vezes admiração a precisão com que o autor do “Pai Coriot” descreve certas espécies mórbidas (a agonia de Goriot, por exemplo, é notável), expondo, com o rigor de um clínico, os sintomas, a marcha e o desfecho da moléstia. 

O grande pensador alemão Engels disse que Balzac lhe ensinara, até nos detalhes econômicos, mais do que todos os livros de todos os historiadores profissionais, os economistas e os estetas.

Stephan Zweig, em sua obra “Os Construtores do Mundo”, referindo-se a Balzac, entre outras coisas curiosas, faz esta pergunta: – “Quando e de onde vieram para o espírito de Balzac todas essas extraordinárias provisões de conhecimentos concernentes a todas as profissões, a todas as matérias, a todos os temperamentos e a todos os fenômenos?”

Nós sabemos que todo esse grande e multiforme cabedal de conhecimentos que Balzac possuía foi adquirido em vidas anteriores e que então afloravam, como reminiscências, por serem patrimônios que jamais ficam perdidos para o Espírito. Os seus amigos do Espaço, portanto, encontravam nele facilidade na transmissão de seus pensamentos, ideias, teorias e concepções relativas aos mais diversos setores do conhecimento humano: – filosófico, literário e científico.

Acreditamos não ser necessário continuemos exumando das obras de Balzac os elementos que comprovem, com abundância de detalhes, a pluralidade das existências e a força mediúnica de que ele era detentor.

Às onze horas e meia da noite de 18 de Agosto de 1850, o Espírito de Honorato de Balzac abandonou o corpo somático a que estivera ligado durante 51 anos de vida agitada e tumultuosa. A cerimônia de sepultamento de seus despojos foi imponente. Vítor Hugo proferiu junto ao túmulo uma bela alocução, exaltando o seu gênio e a sua obra, “cujos livros, em sua totalidade, afirmou ele, formam um só livro, livro vivo, luminoso, profundo, onde se aprecia o vaivém de toda a nossa Civilização contemporânea, com um não sei quê de espanto e de temor, de permeio com o real; livro maravilhoso que o poeta intitulou “Comédia Humana”.

As últimas palavras de Vítor Hugo comoveram todos os presentes:

“Não é verdade, vós que me escutais? Semelhantes esquifes demonstram a imortalidade. Em presença de certos mortos ilustres, sente-se mais distintamente os diversos destinos desta inteligência que atravessa a Terra para sofrer e para purificar-se, inteligência que se chama Homem, e daí o levar-nos a declarar ser impossível que esses que foram gênios, durante a vida terrena, não sejam almas após sua morte!”

Dizem que as derradeiras palavras proferidas por Honorato de Balzac, o mais genial novelista de todos os tempos, foram estas: – “Morro por ter trabalhado demais.”

Felizes daqueles, sim, que morrem com as mãos no arado! Porque o trabalho é a mais abençoada das orações que o homem pode e deve dirigir: 

Àquele que é a fonte inesgotável de trabalho – Deus – nosso Pai Celestial! 

Fonte: Grandes vultos da humanidade e o espiritismo.

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