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Lá no sertão de Goiás

Autor: Marcus Vinicius de Azevedo Braga

Clássico na voz de Tonico e Tinoco, sucesso da música caipira desde a década de 40, a canção “Chico Mineiro” narra, de forma poética, a história de um homem que descobre, apenas após a morte deste, que seu amigo e subordinado era na verdade seu legítimo irmão. A bela música, cantada até hoje nos programas de televisão de música raiz, traz em si um grande ensinamento, como veremos nesse artigo.

O Evangelho segundo o Espiritismo, em seu Capítulo XIV – “Honrai vosso pai e vossa mãe”, no tópico cinco, nos fala da passagem evangélica na qual Jesus pergunta: “Quem é minha mãe e quem são meus irmãos?”, trazendo as considerações de Kardec sobre a parentela física e a espiritual. Entretanto, a lição traz outras reflexões, não explicitadas, apoiadas pela história do Chico Mineiro, ocorrida lá no “sertão de Goiás”.

Relembramos que na visão reencarnacionista, recebemos na família amigos e inimigos de outras existências, no cadinho depurador do lar, como mecanismo de evolução espiritual. Disso não temos dúvida, como ideia que reforça o nosso compromisso com os que conosco dividem os laços genéticos.

Entretanto, assim como Jesus perguntou sobre quem era seu irmão, a interrogação vagueia nossa mente, na reflexão de que a necessidade de fazer o bem não deve se circunscrever ao lar. A fraternidade não pode ser restrita a uma visão corporativista de ajudar apenas aqueles que ostentam nosso sobrenome.

Não falamos de abandonar os compromissos familiares, e sim que o amor é uma força que se expande, sem muros ou barreiras. E constitui uma força que se reproduz. Quantas vezes em nossa vida precisamos amar o próximo mais distante, para aprender a amar nossos familiares?

O fato é que o amor somente pelos familiares não basta. Faz-se necessário expandir esse sentimento, pois, pela lei divina da reencarnação, as famílias se mesclam, por força dos laços construídos nas encarnações, nas lutas cotidianas, pela amizade e pelo casamento, assim como pelo ódio. Como disse Jesus, não sabemos quem são nossos irmãos. Ou quem será. Resumindo, importante termos em mente que somos todos irmãos e a reencarnação torna isso uma verdade concreta.

Por isso, o fato de virar uma música o espanto do boiadeiro ao saber que o Chico Mineiro era seu legítimo irmão demonstra como estamos distantes desse ideal de fraternidade universal, de enxergar em cada indivíduo encarnado, independente de etnia, raça, nacionalidade, um irmão.

O nosso irmão é nosso próximo. Quando perguntaram a Jesus quem era o nosso próximo, ele respondeu com a bela Parábola do Bom Samaritano, mostrando que o próximo é todo aquele que necessita de nosso concurso, nas batalhas da vida, para além de denominações temporárias.

Esse amor fraternal é que dá liga, como um visgo a unir a humanidade. O Amor fraternal é o sentimento de responsabilidade e cuidado por qualquer outro ser humano e, como dito pelo escritor Erich Fromm, no seu interessante “A arte de amar” (1966), esse tipo de amor caracteriza-se pela falta de exclusividade, pela solidariedade.

Assim, queremos mais que um milhão de amigos, queremos um mundo mais irmão. Entretanto, irmão não é quem comunga a nossa ideologia, é sim todo ser criado por Deus, nosso Pai. Jesus nos lembrou disso em várias passagens, ao afirmar o amor ao próximo como o mais importante de tudo.

Os versos de Chico Mineiro continuarão sendo entoados, como bela canção do repertório nacional. Porém, ao ouvirmos seus acordes, nos lembraremos também de que, como espíritas, temos consciência de que os que nos cercam são nossos legítimos irmãos, companheiros na viagem que chamamos de existência.

O consolador – Ano 6 – N 278

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