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O joio e o trigo

Autor: Rogério Miguez

Estudar cuidadosamente as Obras Básicas do Espiritismo é uma norma sábia e deve ser exercitada constantemente, jamais deve ser esquecida, tampouco preterida. A Doutrina Espírita, codificada por Allan Kardec, não é uma filosofia, ciência e religião, que deva ser lida como se lê um romance. Muitos não se dão ao trabalho de estudar, fazer pesquisas, comparar textos, e, após a simples leitura de um livro, julgam que a obra está estudada. Com a Doutrina isto não é recomendado.

Quanto mais se conhece a literatura básica espírita, mais se percebe como ela é rica de ensinos. Não poderia ser de outro modo, já que, além daquele de considerável evolução  – Allan Kardec – que registrou metodicamente os relatos e informações de variados Espíritos, contribuíram também no conjunto da obra alguns Espíritos muito bem preparados, conforme se lê nos Prolegômenos de O livro dos espíritos. Acresce, ainda, que todos trabalharam sob orientação do guia e modelo a ser seguido: Jesus, o Cristo. Sendo o Espiritismo o Consolador Prometido, seus fundamentos não devem ser vistos como escritos passageiros ou meramente transitórios.

Pela falta deste entendimento, muitos espíritas estão se deixando levar por novidades pseudoespíritas de autores desencarnados, que nada mais desejam do que lançar dúvidas e propostas tendenciosas sobre as bases doutrinárias. Esses Espíritos estabelecem uma verdadeira aliança com o médium desatento e vaidoso. Desta parceria, ambos têm seus interesses particulares atendidos que somados redundam em uma literatura falsa, apócrifa, que vem perturbando sobremaneira a evolução da prática e entendimento entre os espíritas, dividindo opiniões e, em consequência, enfraquecendo o conjunto, objetivo principal dos modernos e astutos falsos Cristos.

Estes falsos profetas do lado de lá, que às vezes se apropriam de nomes famosos, escrevem coerentemente sobre muitas máximas espíritas, pois sabem que no meio espírita existem aqueles que têm um conhecimento aprofundado da Doutrina, todavia, em meio de conceitos verdadeiros, lançam, sutilmente e com habilidade, armadilhas doutrinárias, que nem todos sabem distinguir facilmente.

A situação é delicada, visto existir opinião generalizada de que foi recomendado que tudo se leia e que se retenha a parte boa do que se lê. Entretanto, reflitamos, exercitemos um pouco do bom senso tão característico do mestre de Lyon: como distinguir a boa parte de um texto, se aquele que lê desconhece em profundidade a base doutrinária? – Tudo indica ser uma atividade perdida e extremamente perigosa. Além disso, em nossa moderna sociedade, o tempo é bem muitíssimo precioso. Então, qual a razão de se ler livros sabidamente duvidosos para de lá tentar retirar o que existe de bom? – Não seria um claro exemplo de contrassenso, opondo-se frontalmente ao bom senso!? – O indivíduo, que pouco tempo tem para se dedicar a leituras e estudos, deixa de lado livros consagrados e sem máculas na ânsia de encontrar possíveis boas propostas em literaturas reconhecidamente questionáveis.

Há disponível uma quantidade imensa de livros espíritas, e não diremos bons livros espíritas, pois acreditamos todos os verdadeiros livros espíritas são bons, notadamente mais de 450, psicografados por Chico Xavier, dezenas de excelentes livros de Yvonne Pereira, José Raul Teixeira, apenas para citar alguns dentre tantos outros autores encarnados e desencarnados. Autores clássicos, como Léon Denis, estão quase que totalmente esquecidos. Léon Denis, aquele que foi também conhecido como o “Apóstolo do Espiritismo”.

Argumenta-se ainda que o próprio Allan Kardec recomendou no Catálogo racional: Obras para se fundar uma biblioteca espírita, que tal biblioteca deveria incluir até mesmo livros contrários ao Espiritismo, portanto, poder-se-ia concluir que não deveria existir por parte dos espíritas nenhuma restrição a qualquer literatura. Esta conclusão nos parece equivocada, pois não foi isso que o Codificador escreveu ao confeccionar este Catálogo. Allan Kardec jamais se expressou desta maneira, muito menos recomendou, basta ler o Catálogo. Igualmente, nesta obra, Kardec ainda não poderia ter expressado preocupação com livros pseudoespíritas, pois estes só surgiram após a vasta disseminação da Doutrina.

Ademais, não se está discutindo sobre livros que combatem abertamente o Espiritismo, aliás livros eticamente corretos, pois o autor demonstra inequivocamente a sua posição de opositor aos princípios básicos da Doutrina, apresenta-se como tal, não precisa se travestir de cordeiro, pois lobo não é. Estamos chamando a atenção para a literatura falsa, desonesta, capciosa, que se diz duplamente espírita na contracapa do livro e na editora, mas introduz falsidades doutrinárias. Estes últimos é que devem ser cuidadosamente observados e preteridos.

É de se notar que aqueles que argumentam não se dever impor restrição a nenhum tipo de literatura, não importa qual proposta traga, não organizem, eles mesmos, bibliotecas com livros de autores contrários à Doutrina, esta sim uma verdadeira orientação de Allan Kardec, deixando, entretanto, e de modo surpreendentemente, adentrar e circular livremente na seara espírita, o livro pseudoespírita, em livrarias e bibliotecas de centros espíritas e, principalmente, com pesar, em feiras de livros ditos espíritas, além de promoverem e incentivarem estudos dedicados a obras de natureza duvidosa, muitas vezes em detrimento das Obras Básicas, no afã de obterem informações novas e surpreendentes, pois, afirmam estes, as Obras Básicas já foram largamente estudadas e estão perfeitamente conhecidas!

Os autores que escrevem contra a Doutrina, opositores declarados, são muito úteis, pois nos instruem sobre como melhorar o nosso próprio entendimento, ajudando-nos a construir a fé que pode e deve encarar a razão, chamando assim a nossa atenção para que nos preparemos melhor para entender, explicar e refutar os argumentos contrários à nossa crença. Veja-se como Allan Kardec foi sábio, prudente e honesto ao elaborar o Catálogo, incluindo obras contrárias ao Espiritismo, em oposição à nossa fé e entendimentos, pois são exemplos do exercício da liberdade de pensar, um dos princípios basilares da própria Doutrina.

Todavia, retornemos a nossa atenção aos embusteiros de toda ordem. São inteligentes, muito hábeis intelectualmente, alguns falsos sábios, outros sutilmente contra a Doutrina, mas com a particularidade de não se apresentarem como tais, ao invés, bem preparados e instruídos; usam uma linguagem correta; o estilo é agradável; estruturam bem as suas propostas; na edição, sugerem capas de livros muito bem elaboradas e chamativas; citam com extrema frequência textos das Obras Básicas; abrem as suas mensagens com referências doutrinárias muito conhecidas; recorrem a frases de efeito de autores espíritas de renome; chegam mesmo a dizer que o leitor deve rejeitar verdades em nome de uma única teoria falsa; em suas narrações absurdas, são tão ousados, que até envolvem falsamente antigos espíritas que se destacaram no Movimento quando aqui estiveram reencarnados, descrevendo com riqueza de detalhes supostas atividades de auxílio no plano espiritual em conjunto com tais espíritas, agora Espíritos desencarnados. Tudo isto somado, deixa o incauto muito confiante e aberto às “novidades”, que são incluídas nas entrelinhas dos textos, aqui e ali. Lançam as suas propostas indecorosas, misturadas entre muitos conceitos irretocáveis do ponto de vista doutrinário.

O texto é tão bem elaborado que alguns leem repetidamente e são incapazes de separar o joio do trigo, mesmo que o primeiro esteja ali, evidente, claro, sem remates, pois está muito bem semeado junto ao trigo, este último a boa e única parte que nos interessa, que pode ser colhido farta e facilmente nas Obras Básicas.

É a realidade neste particular momento de transição em nosso planeta Terra, solicitando-nos veementemente atenção redobrada, para que não compactuemos com estes enxertos doutrinários, tampouco os divulguemos, os quais nos convidam, pouco a pouco, a que baixemos a nossaguarda moral, assim permitindo que ideias esdrúxulas adentrem os centros espíritas e conspirem contra a boa ordem do Movimento.

Espíritas, oremos; contudo não nos esqueçamos de que, nestes tempos turbulentos, temos a obrigação de vigiar com especial atenção estas duplas formadas por médiuns perturbados e seus parceiros da erraticidade, pois o que está se vendo em profusão são médiuns fascinados aliados a mistificadores, ambos vaidosos, ávidos por evidência, e inconsequentes, escrevendo errado por linhas certas.

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