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Palestras familiares de além-túmulo: Clara Rivier

Revista Espírita, março de 1863

Sociedade espírita de Paris, 23 de janeiro de 1863 – Médium: Sr. Leymarie

O Sr. J…, médico em…, (Gard), relata-nos este fato:

“Uma família de trabalhadores, meus vizinhos de campo, tinha uma filha de dez anos, chamada Clara, completamente enferma havia quatro anos. Em toda a sua vida jamais soltou um lamento, nem deu um sinal de impaciência. Posto sem instrução, consolava a família aflita, falando da vida futura e da felicidade que ali devia encontrar. Morreu em setembro de 1862, após quatro dias de torturas e convulsões, durante as quais não cessou de orar a Deus. “Não temo a morte, dizia ela, porque depois me está reservada uma vida feliz”. Dizia a seu pai, que chorava: “Consola-te; eu virei visitar-te; minha hora está próxima, eu o sinto, mas quando chegar, eu saberei e te avisarei antes”.

“Com efeito, quando estava para chegar o momento fatal, chamou os seus dizendo: ‘Não tenho mais que cinco minutos de vida. Dai-me as vossas mãos’. E expirou, como havia anunciado.

“Depois disso, um Espírito batedor tem vindo visitar a casa dos Rivier, onde derruba tudo. Ele bate na mesa como se tivesse um macete; agita as cortinas, mexe na louça e joga bolas no celeiro. Esse Espírito apareceu sob a forma de Clara à irmãzinha dela, de apenas cinco anos. Segundo a menina, sua irmã lhe falou muitas vezes, e o que exclui o pensamento de incerteza é que as aparições lhe fazem soltar gritos de alegria, ou de lamentação, se não fazem logo o que ela deseja, isto é, apagar o fogo e todas as luzes do quarto onde se dá a visão, enquanto a criança não cessa de dizer: ‘Mas vejam como Clara está linda!’

“Desejando saber o que Clara queria, ela pediu ao pai que lhe devolvessem o cabelo que lhe haviam cortado, conforme costume da região. Mas, posto tivessem os pais satisfeito o desejo, levando os cabelos ao túmulo, o Espírito continuou as visitas e o barulho, que eu mesmo testemunhei, a ponto de os vizinhos e os amigos se comoverem. Então doutrinei os pais, perguntando se não tinham nada a se censurarem em relação a alguém, ou cometido qualquer ação desleal. Era provável que o Espírito os atormentasse enquanto não tivessem reparado suas faltas, para o que os aconselhei, seriamente.

“Durante minha ausência forçada de dez dias, a obsessão tomou um caráter mais violento, a ponto de Rivier travar luta corpo a corpo e ter sido derrubado. O terror apoderou-se desses infelizes, que foram consultar um médium, o qual os aconselhou a dar uma esmola geral a todos os pobres da região, esmola que durou dois dias. Eu vos comunicarei o resultado, e serei feliz se receber vossos conselhos a respeito.”

1. Evocação de Clara Rivier. ─ Estou ao vosso lado, disposta a responder.

2. ─ De onde vos vêm, posto que tão jovem e sem instrução, as ideias elevadas que externastes sobre a vida futura, antes de vossa morte? ─ Do pouco que devia passar no vosso mundo e de minha precedente encarnação. Eu era médium quando deixei a Terra e era médium ao renascer entre vós. Era uma predestinação. Eu sentia e via o que dizia.

3. ─ Como é que uma criança de vossa idade não soltou nenhum lamento durante quatro anos de sofrimentos? ─ Porque o sofrimento físico era dominado por uma força maior, a de meu anjo de guarda, que eu via continuamente junto a mim. Ele sabia aliviar tudo o que eu sentia. Ele tornava minha vontade mais forte que a dor.

4. ─ Como fostes prevenida do instante da morte? ─ Meu anjo de guarda me dizia. Ele jamais me enganou.

5. ─ Dissestes ao vosso pai: “Consola-te. Eu virei visitar-te.” Como é que animada de tão bons sentimentos para com os pais, vínheis atormentá-los após a morte, fazendo barulho em sua casa? ─ Sem dúvida eu tive uma prova, ou antes, uma missão a cumprir. Se venho rever meus pais, credes que seja por nada? Esses ruídos, essa perturbação, essas lutas provocadas por minha presença são uma advertência. Sou ajudada por outros Espíritos, cuja turbulência tem um valor, como eu tenho o meu, aparecendo à minha irmã. Graças a nós, muitas convicções vão surgir. Meus pais tinham que passar por uma prova. Ela cessará em breve, mas só depois de haver levado a convicção a uma porção de Espíritos.

6. ─ Assim, não sois vós pessoalmente que causais essa perturbação? ─ Sou ajudada por outros Espíritos que servem à prova reservada a meus pais.

7. ─ Como é que vossa irmã vos reconheceu se não sois vós que produzis as manifestações? ─ Minha irmã só viu a mim. Ela possui agora uma segunda vista e não será a última vez que minha presença virá consolá-la e encorajá-la.

8. ─ A esmola geral que foi aconselhada aos vossos pais terá o efeito de cessar a obsessão? ─ A obsessão terminará quando chegar o momento necessário. Mas, crede, a prece e a fé dão grande força para dominar a obsessão. A própria esmola é uma prece. Ela serve para consolar e assim nos ajudar a levar a convicção a muitos corações. É pela fé que devemos levantar e salvar toda uma população. Que importa se os inimigos do Espiritismo gritam que é o demônio! Esse grito, em todos os tempos, motivou a conhecê-lo, e para um que cede, há uma centena cuja curiosidade leva ao estudo. A obsessão e a subjugação, na verdade, são provas para quem as sofre, mas, ao mesmo tempo, um caminho aberto a novas convicções. Esses fatos forçam a falar dos Espíritos, cuja existência não se pode negar, vendo o que fazem.

OBSERVAÇÃO: Parece evidente que, neste caso, a esmola aconselhada ao casal Rivier era, ao mesmo tempo, uma prova para eles, mais ou menos proveitosa conforme a maneira que tenha sido feita, e um meio de chamar a atenção de um maior número de pessoas para os fenômenos. É um meio de provar que o Espiritismo não é obra do demônio, pois aconselha o bem e a caridade para combater aquilo a que chamam demônios. O que podem fazer os adversários do Espiritismo contra manifestações desse gênero? Podem proibir que se ocupem com os Espíritos, mas não podem impedir que os Espíritos venham, e a prova disso é que essas manifestações se produzem nas próprias casas onde não as querem provocar e que, por sua reputação de santidade, parece que deveriam desafiá-las, caso fosseo diabo. Contra fatos não há oposição nem negação que possam prevalecer, de onde é forçoso concluir-se que o Espiritismo deve seguir seu curso.

9. ─ Por que, tão jovem, vos afligiram tantas enfermidades? ─ Eu tinha faltas anteriores a expiar. Tinha usado mal a saúde e a posição brilhante de que desfrutava na precedente encarnação. Então, Deus me disse: “Gozaste grandemente, desmesuradamente e sofrerás do mesmo modo; eras orgulhosa e serás humilde; eras convencida de tua beleza e serás quebrada; em vez da vaidade esforçar-te-ás por adquirir a bondade e a caridade.” Fiz segundo a vontade de Deus e meu anjo de guarda ajudou-me.

10. ─ Queríeis que algo fosse dito aos vossos pais? ─ A pedido de um médium, meus pais fizeram muita caridade. Eles tiveram razão para não orar sempre com os lábios; é necessário fazer com a mão e com o coração. Dar aos que sofrem é orar, é ser espírita. Deus a todas as almas deu o livre-arbítrio, isto é, a faculdade de progredir. A todas deu a mesma aspiração, e é por isso que o sofrimento atinge os felizes da Terra mais do que geralmente se imagina. Assim, encurtai as distâncias pela caridade; introduzi o pobre em vossa casa, encorajai-o, levantai-o, não o humilheis. Se em toda parte se soubesse praticar essa grande lei da consciência, não se teria, em determinadas épocas, essas grandes misérias que desonram os povos civilizados, e que Deus envia para castigá-los e lhes abrir os olhos. Caros pais, orai a Deus; amai-vos; praticai a lei do Cristo; não façais aos outros o que não quereríeis que vos fosse feito; implorai a Deus que vos prove, mostrando-vos que a sua vontade é santa e grande como ele. Prevendo o futuro, sabei armar-vos de coragem e perseverança, porque sois chamados ainda a sofrer. É preciso saber merecer uma boa posição num mundo melhor, onde a compreensão da justiça divina se torna a punição dos maus Espíritos. Estarei sempre junto de vós, caros pais. Adeus, ou melhor, até logo. Tende resignação, caridade, amor aos semelhantes, e um dia sereis felizes.

CLARA

OBSERVAÇÃO: Eis um belo pensamento: “O burel toca mais os vestidos bordados a ouro do que geralmente se pensa”. É uma alusão aos Espíritos que, de uma existência a outra, passam de uma posição brilhante a outra humilde e miserável, porque muitas vezes, expiam num meio ínfimo o abuso dos dons que Deus lhes havia concedido, É uma justiça que todo mundo compreende.

Outro pensamento não menos profundo é o que atribui as calamidades dos povos à infração da lei de Deus, porque Deus castiga os povos como castiga os indivíduos. É certo que se praticassem a lei da caridade, nem haveria guerras, nem grandes misérias. É a prática dessa lei que conduz o Espiritismo. Será por isso que encontra inimigos tão encarniçados? As palavras da menina a seus pais serão as de um demônio?

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