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Uma proposta de reflexão para os educadores de jovens

Autor: Daniel Soares

É muito frequente vermos em conversas ou em memes de internet comparações genéricas entre as gerações de jovens no decorrer da história. Portanto, não raro ouvimos a expressão “geração Nutella” para se referir às gerações nascidas após os anos 2000, ou até mesmo antes disso. Esta opinião parece vir da percepção de que os jovens supostamente teriam menor força mental para suportar dificuldades e de que estes reclamam demais das circunstâncias da vida. É evidente que esta opinião surgiu da comparação entre gerações de pessoas que viveram situações econômicas, sociais e culturais muito diversas, portanto, não seria este tipo de comparação um tanto limitada ou até mesmo desonesta?

Como comparar gerações que viveram circunstâncias históricas totalmente diferentes sem faltar com a coerência? A verdade é que os jovens de todas as gerações enfrentaram e enfrentam desafios em comum, como a carência afetiva em relação a amigos ou relacionamentos amorosos, a insegurança e o receio do jovem de não ser bom o suficiente para merecer a amizade ou o amor de outrem, o medo da exposição e do desconhecido, a sensação de deslocamento, a pressão da sociedade para que cumpram seus papeis de cidadãos produtivos, etc. Mas certas questões desafiantes que se apresentavam no passado já não se apresentam hoje, o que é ótimo, mas tantas outras que não existiam no passado hoje se colocam em alto nível de dificuldade.

No passado a educação era, muitas vezes castradora e até mesmo violenta, o consumo era limitado e havia pouco acesso a bens de consumo básico, a vigilância perante infrações era muito mais restrita, a comunicação era dificultosa assim como o transporte, e o acesso à informação era escasso. O trabalho era mais braçal e, portanto, mais exaustivo, e as condições de saúde eram deveras precárias. O preconceito de todo tipo era maior e não havia uma rede apoio explícita onde se conseguia auxílio para problemas psiquiátricos, e a pressão social no que tange as tradições era enorme, dado que um leve desvio da conduta esperada poderia significar julgamento e exclusão social, inclusive pela própria família.

Por outro lado, a educação envolvia uma relação mestre/aprendiz ou educador/educando, em que existia uma preocupação de longo prazo para com o desenvolvimento educacional. Os costumes e tradições familiares mantinham as famílias mais unidas e mais seguras emocionalmente. O emprego gozava de maior estabilidade e planos de carreira que duravam quase uma vida inteira. Os relacionamentos também eram mais estáveis, tanto na amizade quanto no namoro, pois a solidez das relações era claramente maior, além do que os casais se esforçavam mais para fazer dar certo.

No presente, temos professores mais respeitosos com os alunos, temos acesso amplo ao consumo de produtos antes inimagináveis. A vigilância, seja analógica ou tecnológica, é muito maior. A comunicação ocorre em tempo ínfimo e o transporte é mais acessível. Existe bastante trabalho intelectual e a segurança do trabalho aumentou muito. Hoje em dia a informação é relâmpago e facilmente acessada. O combate aos preconceitos é abrangente e constante, e hoje há uma rede de apoio enorme para pessoas que sofrem com quaisquer tipos de problemas, e algumas das pressões sociais se atenuaram enquanto outras parecem ter aumentado.

Por outro lado, temos uma crescente penetração do mercado nas instituições de ensino acompanhada de um desmantelamento da ideia de mestre/aprendiz, o que tem tornado cada vez mais a educação um processo mercantil em que o aluno se configura como cliente enquanto o professor e a instituição se colocam como prestadores de serviços. Hoje em dia há tantos bens em circulação que se tornou necessário criar a propaganda e o marketing para criar uma cultura de consumo que dê conta de toda a oferta disponível. Isso fez com que a formação dos indivíduos se confundisse com a formação de consumidores desde a mais tenra idade. O trabalho tornou-se mais fluido e rotativo, as relações trabalhistas menos sólidas, as exigências de qualificação cresceram, a vigilância do trabalho passou a contar com indicadores que mapeiam cada passo do trabalhador.

As relações familiares e o carinho familiar tornaram-se relações de troca com laços emocionais extremamente frágeis. As amizades são fluidas e fugazes, e os relacionamentos se tornaram líquidos e superficiais, com troca frequente de parceiros(as), aplicativos de namoro, ampla experimentação sexual e pouca segurança nas relações, altos índices de divórcio, etc. Há tanto conhecimento disponível que o excesso de informações leva as pessoas de hoje à exaustão mental, e os momentos em que não se está em contato com telas absorvendo mil informações por minuto tornam-se momentos de tédio e dificuldade de concentração. E, por fim, vivemos numa época de grande ceticismo quanto às questões religiosas, principalmente nos meios de intelectualidade. O materialismo se apresenta com um aspecto de sagacidade, como extensão da certeza de que só a ciência pode resolver os problemas da humanidade.

Portanto, as dificuldades estarão sempre alinhadas aos fatores sociais e ao humor da geração de espíritos encarnados naquele recorte de tempo. Se analisarmos bem, a geração atual também precisa lidar com questões muito complicadas nos dias de hoje. O jovem, que já é naturalmente inseguro, sente-se deslocado, receoso e insuficiente para lidar com os desafios de sempre, e quando posto frente a frente com todas estas novas questões, claramente irá sofrer e cometer muitos erros. Além de tudo isso, esta é uma geração encarnando no período final de transição planetária. Seu planejamento reencarnatório incluiu uma grande autocobrança com relação ao futuro de sua existência. Mas as facilidades tecnológicas que o mundo de hoje oferece nos dá a falsa sensação de que eles não possuem problemas válidos e difíceis de lidar. Sendo assim, precisam amadurecer com terapia de choque. Será mesmo?

Vamos nos lembrar da capacidade e da disposição pedagógica de Jesus. Ele não lidava com pessoas fáceis nem razoáveis. Para ele se apresentavam situações extremas de barbaridade. Ele teve que lidar com a preguiça, com provocações, com tentativas de difamá-lo, com a cabeça dura de seus aprendizes muitas vezes. Mas Jesus, em sua perfeição, jamais aplicou terapia de choque. Sempre se adaptou à capacidade de compreensão de quem lhe ouvia, traduzindo grandes lições em histórias sobre pesca, viagens, fenômenos da natureza, etc. Quando falou com os potenciais assassinos da mulher adúltera, encontrou uma estratégia para tocar-lhes o coração e os fazer desistir por si mesmos. Tudo o que Jesus nos disse nos leva a entender que devemos nos esforçar para ensinarmos uns aos outros com paciência, se preciso nos adaptando e aprendendo novas formas de comunicarmos a mesma coisa.

Pensando nisso, eu gostaria de finalizar este texto elencando pelo menos uma das diversas alternativas disponíveis que nos ajudam a lidar – seja através das relações sociais, seja através do processo educacional – com os jovens que vivem cotidianamente com as problemáticas supracitadas. Uma estratégia de comunicação, sendo educador ou não, que se assemelha bastante com aquilo que Jesus nos ensinou é a Comunicação Não-Violenta, de Marshall Rosenberg. Este modelo nos ensina a nos utilizarmos da empatia como instrumento supremo do processo de comunicação. Ele também nos auxilia a mediar conflitos, retirar bloqueios defensivos e compreender de que os outros necessitam.

São 4 passos que nos permitem aplicá-la quando falamos ao outro:

1- observação sem julgamentos (suspenda certezas)

2- identificar nossos próprios sentimentos (e nos responsabilizarmos por eles)

3- identificar que necessidades temos

4- formular pedidos ao outro ou transmitir-lhe uma mensagem

Esta é uma ferramenta poderosa para qualificarmos nossa própria comunicação e assim conseguirmos estabelecer laços com a pessoa que está recebendo nossa mensagem. Mas a CNV também pode ser utilizada como método de análise da comunicação do outro. Sendo assim, os processos seriam:

1- observação sem julgamentos

2- identificar os sentimentos do outro (faça perguntas)

3- identificar as necessidades do outro a partir de seus sentimentos (faça mais perguntas)

4- formular uma abordagem que dê conta de seus sentimentos e necessidades

A partir desta estratégia conseguimos compreender os problemas que atingem as pessoas para quem estamos tentando passar uma mensagem e adaptar nossa abordagem de acordo com este entendimento. Sem julgamentos normativos, apenas fazendo como Jesus fez: tendo muito afeto pelo gênero humano e muita disposição para contribuir com seu melhoramento. É preciso se inspirar na energia que tinha Jesus para buscarmos conhecimento no intuito de adquirir as ferramentas pedagógicas e discursivas adequadas, pesquisar sobre os interesses de nosso público-alvo, suas dificuldades, suas dores, suas incertezas. É muito fácil dizer que os jovens são acomodados, preguiçosos, moles, etc. Aqui buscamos desfazer alguns destes prejulgamentos, porém, ainda que isso fosse verdade, quem senão os trabalhadores do Cristo iriam agir para reverter este quadro? Cabe a nós apontar o dedo e dizer o que falta na outra pessoa, ou lhes estendermos a mão?

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